Portugueses que vivem em Moçambique estão encurralados entre o Estado Islâmico, a guerrilha de dissidentes da Renamo e a pandemia do COVID- 19 e não conseguem chegar a Maputo onde se fazem os únicos voos para fora do país. As suas vidas estão em risco. Entre os vários portugueses que procuram uma saída, está um alpiarcense, o homem conhecido como “o construtor” da Barragem dos Patudos, engenheiro Leonel Piscalho.
O secretário-geral das Nações Unidas -ONU, António Guterres, apelou hoje ao cessar-fogo em África e à intervenção dos países mais influentes na resolução de uma paz a prazo, de forma a evitar que a pandemia do COVID-19 se torne uma catástrofe em África.
Sem estruturas sanitárias e hospitalares de alcance a toda a população, o impacto de uma pandemia como a do COVID-19 no continente africano é dramático, tanto a nível humanitário como económico. Esta situação é agravada pela situação económica e política que se vive nalguns países. Acrescentamos ainda que o pico do número de infetados será mais tarde, uma vez que os primeiros casos surgiram também mais tarde. Moçambique é o caso de um dos países que vai apostar sobretudo na prevenção – disse o Ministro da Saúde, Armindo Tiago, em declarações à Lusa, acrescentando que “o país pode ainda responder adequadamente pelo facto de possuir um número reduzido de infeções”.
Mas Moçambique tem ainda a guerra, mais um problema humanitário a acrescentar : o Daesh a ocupar a zona norte do território moçambicano – os jihadistas de Cabo Delgado tomaram Mocimboa da Praia e Quissanga e dissidentes da Renamo com ataques em Sofala e Manica, sobretudo em zonas como as estradas nacionais, EN1 e EN6, mais a centro do país. Relatos de dezenas de mortos entre militares e civis.
O Estado Português estabeleceu voos a partir de Maputo para retirar portugueses de Moçambique. Mas isto serve os portugueses residentes em Maputo ou nas proximidades.
Quem se atreve a atravessar o país para chegar a Maputo, a sul?
Há portugueses a viver noutras províncias. É o caso de Leonel Piscalho. A viver em Moçambique há 26 anos, é docente na Universidade Zambeze e, como engenheiro, realizou variadas obras em 5 das 10 províncias do país. Casado com uma moçambicana é um apaixonado por Moçambique do qual diz” desejo o melhor a este povo; onde dediquei os melhores anos da minha vida e de quem recebi sempre as melhores atenções” , talvez “as atenções” que a sua terra natal tarda em lhe prestar.
Apesar das dificuldades nas comunicações, entrámos em contacto com o engenheiro Leonel Piscalho que nos disse não compreender a forma como se organizam estes voos de apoio a portugueses. Com o seu voo da TAAG cancelado pela empresa e sem ser reembolsado, solicitou um voo na TAP através da agência COTUR, indicada pelo Consulado na Beira, província onde vive Leonel Piscalho. Além dos preços terem aumentado exponencialmente (dos 1000 euros cobrados pela TAAG para 2650euros da TAP), o voo não se faz da Beira mas só a partir de Maputo. Como referiu “não há segurança rodoviária garantida a partir da Beira quer na ligação ao sul (Maputo), quer a oeste (Chimoio e Tete) quer a norte ( Nampula, Pemba e Lichinga).
Leonel Piscalho não percebe “como não se faz escala na Beira ou Nampula pois estes aeroportos tem condições para isso”. “Nesta vasta área de território dependente do apoio Consular da Beira poderia ser suficiente para lotar um avião só por si, como já aconteceu antes.” – disse ainda.
Neste momento, referiu que é “difícil movimentar dinheiro no banco, vai ter de leiloar os seus bens para arranjar dinheiro” e isso não se consegue fazer em horas. E tem receio pela situação sanitária e económica no país . Receia pelos seus alunos que viram as aulas suspensas, alunos que, diz, merecem todo o seu respeito assim como a empresa com a qual tem colaborado.
Que o Estado, olhe a situação especifica de Moçambique. Portugal não é só Lisboa. Nem Moçambique é só Maputo. Há portugueses retidos, encurralados e que temem pela sua vida.
Ainda com um tom de humor para não perder o norte (ou o sul) à vida (ou porque o cansaço de uma “guerra” já nem se disfarça) diz que depois quando chegar a Portugal “precisa de dois pares de patins para chegar a Alpiarça se não encontrar boleia ou um local em Lisboa para fazer a “catorzena”.