Restaurante Os Arcos: “O principal é não ter medo de arregaçar as mangas”

Idalécia Pestana é a orgulhosa proprietária de um espaço hoteleiro que ganhou fama à custa de muito trabalho e dedicação. O gosto pela arte culinária é hereditário e valeu-lhe fama nacional através das famosas Broas Dona Idalécia, que pode apreciar, juntamente com muitos outros sabores, no Restaurante “Os Arcos”.

Quando se estreou na atividade hoteleira e quando decidiu abrir um restaurante por sua conta?
Estreei-me há 20 anos nesta atividade, por necessidade. Antes do restaurante, já era uma empresária a nome individual, tinha um pronto-a-vestir, mas quando chegaram os centros comerciais, as coisas desabaram um pouco por todo o lado, e isso deixou-me com um dilema: ou vendia tudo ou mudava de ramo. Acabei por ter de apostar em algo diferente, que foi a hotelaria. De início, tinha apenas um café e ia fazendo serviços de catering – que era algo que estava muito na moda – em quintas durante as provas de vinho. O restaurante em si, abri há 10 anos. A partir daí nunca mais parei.

Fez alguma formação dentro da área?
A formação certificada que fiz, adveio da necessidade de estar coletada mas a verdadeira formação/experiência foi a minha mãe que me ensinou.

O que podem degustar os clientes que visitem o seu espaço?
Um dos pratos que acho que as pessoas mais gostam aqui no restaurante é o bacalhau com broa, recebe muitos elogios. Para além deste prato, tenho também o magusto com bacalhau, o borrego de Alpiarça, ou seja, aposto bastante nos pratos tradicionais mas também confecionamos outro tipo de pratos para grupos mais jovens.

Como surgiram as famosas broas Dona Idalécia?
As famosas broas Dona Idalécia surgiram da minha mãe. Ainda muito jovem, a minha mãe foi convidada para trabalhar numa confeitaria de Alpiarça e foi lá que aprendeu muitas das receitas. Eu aprendi com ela em casa porque fui sempre muito curiosa. A pastelaria fina nunca me atraiu muito, sempre gostei mais da doçaria artesanal. Enquanto tive apenas a parte do café aberta eu fazia muitas broas, que eram muito requisitadas. Nessa altura, toda a gente lhes chamava “as broas de Alpiarça”, até que alguém disse “broas de Alpiarça não, as broas da Dona Idalécia” e o nome ficou [risos]. Ainda há pouco, estivemos a fazer uma encomenda de broas para uma empresa de Lisboa. Tem que se saber aproveitar enquanto há trabalho, nem que isso custe muitas noites sem dormir, e quando não há trabalho também não se pode ficar parado, temos de o criar.

Tem um livro de receitas editado. É importante para si haver memória escrita dos sabores que confeciona? Para mim, e para todos nós que cá estamos. Sou a favor de dar as receitas para que outros as possam aprender, até costumo dizer que “se não forem capazes de fazer, passem por cá que eu ensino”. Até posso dizer que vendi muito mais broas desde que editei o livro, este ano. Curioso, não é? Sei que muita gente que comprou o livro já fez as broas em casa mas não é por isso que deixam de vir cá comprá-las. Há pessoas que vivem numa ganância de não quererem dar a receita. A minha mãe nunca foi assim, e eu acho que herdei isso dela. Por isso, este livro é também uma homenagem à minha mãe, que tem 85 anos.

O seu estabelecimento tem sentido o peso da recessão?
Apanhei a crise mesmo em cheio, mas assim como me aconteceu a mim, também aconteceu com os outros.

Como tentou contornar este obstáculo?
Como já tinha muita experiência de como as coisas podem correr mal, assim que vi empresários grandes a desabar, pensei ”isto vai-me calhar também porque estamos num meio muito pequeno, isto vai correr muito mal, de certeza”. Nesse momento, tentei dar a volta da melhor maneira, tive de deixar ir duas senhoras que trabalhavam no restaurante e, a partir daí, lutei um bocado sozinha. Foi uma altura bastante difícil mas nunca cruzei os braços. O principal é mesmo muito trabalho e muita dedicação, sem medo de arregaçar as mangas.

Acha que esse fator de “não cruzar os braços” é o que falta à nova geração?
Julgo que é, principalmente, a falta de experiência, o facto de não se fazerem rodear pelas pessoas mais indicadas – e falo de advogados ou contabilistas, por exemplo, que por vezes podem não ser os melhores do seu ramo – a pouca experiência que a vida lhes dá e, realmente, ter a garra para arregaçar bem as mangas quando as coisas estão a correr mal.

Acha que alguma das suas duas filhas vai continuar o negócio quando a Idalécia pensar em reformar-se?
Nunca se sabe, porque cada uma tem o seu curso. Uma é gestora de empresas e a outra é farmacêutica, as probabilidades de assumirem o negócio do restaurante não são muitas. No entanto, não sabemos as voltas que a vida ainda vai dar, até podem vir a gerir o negócio à distância. Caso isso não venha a acontecer, espero que algum jovem pegue no negócio porque com um bocado de sacrifício consegue-se lá chegar.

Vai estar presente no Mercado de Natal com que tipo de sabores?
Com os meus sabores e vou fazer uma surpresa.

Não quer desvendar uma parte da surpresa?
Não. [risos]

O que prevê para o futuro do restaurante? Pensa reformar-se em breve?
Sim, pelo menos da cozinha, até porque já tenho uma senhora que está a fazer formação comigo. O trabalho da cozinha é muito pesado, e quando o corpo começa a sentir o peso dos anos já não há volta a dar. Sim, começa a tornar-se muito complicado para mim manter-me na cozinha.

Horários e contactos
No café, estamos abertos sete dias por semana, desde as 7h00 até, por vezes, à meia-noite, dependendo da movimentação do café e do restaurante. Em dias calmos, fechamos por volta das 22h00.