Hermínio Ferreira

No dia 6 de janeiro de 2017, faleceu uma das figuras que mais marcou presença na história do futebol em Alpiarça. Hermínio Rui Hipólito Ferreira esteve envolvido na dinamização das secções de futebol desde muito cedo na sua vida e continuou, mais tarde, a ter presença motivadora nas jovens gerações do futebol alpiarcense. Foi nessa altura que desenvolveu uma longa amizade com José João Pais, que não quis deixar de nos contar sobre esses tempos.

Conheci o Hermínio, de um modo mais próximo, nos inícios da década de 90 do século passado. Tudo por causa do futebol.  Por essa altura, o vereador do desporto da Câmara Municipal de Alpiarça era o Henrique Arraiolos. Lançou um desafio às coletividades, no sentido de dinamizarem várias modalidades desportivas, nomeadamente, que me lembre, o basquetebol, o ciclismo, o futebol e outras, propondo-lhes ajuda em termos logísticos e financeiros. Nos Águias, o futebol estava parado. Fui desafiado a integrar uma secção, no sentido de arrancar com uma secção de futebol juvenil face ao prometido apoio da Câmara. Assim foi. Eu, o José Manuel Miranda “Galo”, o Lucílio Ferrão, o Jorge Freitas, o Zé Joaquim Esteireiro, o Zé João Avelino e o António Moreira. Arrancámos com esta estrutura, apoiados tecnicamente pelo Manuel Colhe, a que se juntou depois o Paulo Estudante “Russo”. A coisa pegou, alargou-se a todos os escalões jovens, e nos anos a seguir vieram mais jogadores, mais seccionistas, mais técnicos e mais massagistas (aqui recordo de um modo particular o saudoso Amadeu Gil). Entre os que se juntaram ao grupo, apareceu o Hermínio, cujo filho, o Marco, começava também a dar os primeiros pontapés na bola. Os seccionistas tinham, na grande maioria, filhos a jogar. E foi assim que comecei a privar  mais de perto com ele. A secção tornou-se num grupo de amigos. Era assim que nos víamos uns aos outros. E estendia-se às nossas esposas. Eram elas que ajudavam no bar e confecionavam os bolos que ali se vendiam. E as festas de final de ano desportivo eram momentos altos desta confraternização, desta sã camaradagem. Não admira, pois, que aí se iniciasse uma boa amizade com o Hermínio, com a esposa e com os filhos, que perdurará eternamente. Sempre me habituei a ver o Hermínio como uma pessoa equilibrada, ponderada, amigo de ajudar, sem levantar muito a voz para se fazer ouvir e nunca regateando esforços para desempenhar a missão que lhe era confiada dentro da secção. E nunca falhou. Durante vários anos foi assim.
Mais tarde, por volta de 1995 (se a memória não me atraiçoa) tivemos outro desafio pela frente. As miúdas também queriam jogar à bola. Se não me engano, a oportunidade surgiu durante o aniversário do concelho. Alguém teve a ideia de fazer um jogo de futebol feminino. Eu e o Hermínio achámos piada à ideia e pusemos mãos à obra. Às nossas filhas, que eram “jogadoras”, veio juntar-se um grupo enorme, para surpresa nossa. A cada treino aparecia sempre mais uma. Chegaram a ser mais de duas dúzias. E os treinos arrancaram. O Hermínio era o “mister”. Era o mais entendido na “tática e na técnica”. Tinha sido jogador. Eu dava apoio, e a São Moreira era a massagista. O equipamento foi fornecido pelos Águias. Era uma equipa “profissional”. Por isso, o treino era a sério, que o Hermínio levava tudo a sério. Aconselhava, ria quando era preciso rir, mas encarava a missão com muito respeito e disciplina. Agia como treinador, como um verdadeiro treinador, mas também como um pai e como um amigo. Era assim que o víamos. O primeiro jogo foi com o Valcavalense. Ganhámos 1-0, com golo da Catarina Favas. Um golo histórico na vida do clube. Parecia que tínhamos ganho a liga dos campeões. E outros jogos se sucederam. Em Alpiarça e noutras terras. Nesta autêntica romaria que cada jogo constituía, juntava-se a família de cada uma e os namorados de algumas. O “divertimento” e a amizade foram-se cimentando neste grupo cada vez mais alargado. Posso falar pelo que eu próprio sentia: gostávamos uns dos outros. Cada jogo era um motivo de alegria para todos, os que assistiam e as que jogavam. Com esta “brincadeira”, acabámos por ter 3 jogadoras na seleção distrital, a Joana Pinhão, a Mónica Bernardo e a Lénia, que integraram um jogo com a seleção nacional no relvado do CNEMA. Para nós, isto foi um acontecimento extraordinário, e para elas um momento inolvidável. Para nós foi a recompensa por levarmos esta “brincadeira” a sério. Foi um prémio. Depois, a vida escolar e os empregos fizeram com que as coisas se complicassem, em termos de treino e jogos. Cada um e cada uma foi à sua vida. Mas o que fizemos, todos, foi bonito, muito bonito. E o Hermínio teve a maior quota-parte no êxito dessa iniciativa, que ficou gravada como uma boa memória na vida de quem a viveu.
Foi assim que se construiu e se alimentou a minha amizade com o Hermínio. Amizade tanto mais forte e duradoura por assentar num pilar fundamental em qualquer sentimento: o respeito mútuo. Foi isso que aconteceu. Esta mensagem foi feita ao correr da pena e com a memória a ditar as palavras. É provável que essa mesma memória, que já não é o que era, tenha tido lapsos no seu desfilar. Se qualquer menção, nome ou data, estiver menos correta, isso foi erro involuntário para o qual peço a benevolência do leitor. Mas o essencial está no sentimento com que foi escrito por mim, e esse não está sujeito a correções.

Por: José João Pais

Hermínio Ferreira jogou futebol toda a sua juventude no Clube Desportivo “Os Águias” de Alpiarça, numa época em que era o Ciclismo que dava fama ao clube. Além dos anos que jogou como central nas equipas dos vários escalões d“Os Águias”, ao longo da sua vida, teve também grande influência no desenvolvimento das secções jovens, sendo um dos principais impulsionadores da Secção de Futebol Juvenil. Em conjunto com José João Pais, formaram a única equipa de futebol feminino que existiu no clube, na qual ocupava a posição de treinador. Hermínio Ferreira nunca será esquecido pelas ligações que construiu nos muitos anos que dedicou ao desporto, laços que permanecem até hoje, fortes e familiares, e que não podiam faltar a esta oportunidade de o homenagear.

“Comecei a jogar futebol no Águias com 9 anos de idade. Passados 2 anos fui jogar para o SCP, mas nunca perdi a ligação ao meu clube. O senhor Hermínio será sempre por mim recordado, entre outras pessoas, como um dos responsáveis por essa ligação. Sempre manteve o clube “vivo” e representou-o mesmo com muita dignidade. Homem sério, respeitador, sensato e pacato. Foi com muita tristeza que recebi a notícia do seu falecimento. Um enorme abraço a toda sua família. Que descanse em paz.”
Francisco Saturnino Cunha

“Obrigado Mister, amigo, família. Dedicado, conseguiste juntar um grupo de meninas. Grandes ralhetes que nos davas, mas todos com razão de ser. Lembro-me, uma vez, num jogo com a Lamarosa que estava a ser complicado porque sempre que eu tocava na bola o árbitro apitava, de repente passei-me e fui direita ao árbitro, mas no caminho ouvi um grito teu e… «Ups, vou voltar para trás. É melhor!» Obrigado por tudo, Hermínio!”
Magda Nunes

“Perdeu se um grande homem, pai, marido e amigo… O Sr. Hermínio proporcionoume uma das melhores fases da minha vida, sem dúvida alguma. Por tudo é de valorizar a coragem que, em conjunto com o Sr. José João Pais, tiveram em juntar este belo grupo que mais unido era impossível e do qual tive muito orgulho em pertencer. É de valorizar também todos os raspanetes que me deu porque só queria o meu bem, e resultou pois fez que conseguisse chegar à seleção… Para nós, além do nosso mister, era o nosso amigo e também o nosso pai, principalmente meu porque era das mais novitas do grupo e fezme ver que isso era só um aparte, nada mais… Vai deixar muitas saudades… Até sempre mister.”
Mónica Bernardo

“O mundo ficou mais pobre e mais triste, pois o tio Hermínio já não está entre nós. Homem generoso que era, deixou como herança o amor que dedicou aos seus filhos e aos que faziam parte da vida dele, e todas as lições de vida que aprendeu e nos ensinou. Sempre foi um homem bom e admirável, dedicado à família, aos amigos e ao trabalho. Fez a diferença no mundo. Deixa, com a sua partida, tristeza e muitas saudades. Até sempre, Tio Hermínio.”
João Daniel Avelino

“Lembro-me de ser um homem calmo, reservado, que fumava o seu cigarro com boquilha… Sempre presente nos nossos jogos!”
Pedro Ferrão

“Temos mais uma estrelinha… Que descanse em paz…”
Vanda Lagarto

“Bom, o que posso dizer acerca do Hermínio é que o tinha como uma pessoa de bom trato, amável e brincalhão. Convivi com ele, de uma forma mais cercana, durante os quase dois anos em que fazia parte da equipa técnica, onde jogava o Marco, e ele sempre nos acompanhava, quer em casa quer fora. Eu, apesar de já estar fora há quase 24 anos, durante as férias, e sempre que o via nos Águias ou em outro lado qualquer, sempre o cumprimentei e sempre se trocava meia dúzia de palavras, em especial para recordar esses tempos do futebol. Neste momento, o meu pensamento vai para o Marco, a sua irmã, mãe e restante família. Os meus sentidos pêsames e que descanse em paz!”
Paulo Estudante

“A memória/imagem que tenho do Sr. Hermínio é aquela de uma pessoa calma, que transmite respeito e ao mesmo tempo confiança. Uma pessoa reservada, mas sempre pronta para ajudar os outros. Qualidades e valores de uma pessoa simples, de um ser humano de exceção! A prova disso é a sua família linda que continua agora a obra deste Homem, principalmente através dos seus maravilhosos filhos e netos. O meu abraço forte, de profundo respeito e admiração, vai obviamente para eles. O seu legado é de um inestimável valor social e humano, principalmente para a comunidade Alpiarcense e todos aqueles que, de uma forma direta ou indireta, lidaram com ele. Eu tive a sorte de ser uma delas e por isso mesmo só lhe posso estar eternamente grato. Muito obrigado, Sr. Hermínio!”
Miguel Pais

“O meu amigo Hermínio, como futebolista, coincidiu com o renascer do futebol sénior em Alpiarça, em 1969, pondo fim a um interregno que vinha desde os anos 50. No primeiro ano sobe logo de divisão, tendo passado para a primeira distrital, onde se manteria como jogador até 1977. Jogou sempre no lugar de defesa direito, tendo tido vários treinadores na sua carreira: Isidro, Mário Pereira, Alberto Castelo, e outros, tendo o último sido Ernesto Costa, no seu último ano. Não tive o prazer de jogar com ele nos seniores tendo, no entanto, treinado muita vez com essa equipa, treinada pelo mister Ernesto, na disputa de jogos de treino contra os juniores. Mantivemos uma grande amizade ao longo das décadas seguintes, ficando para sempre na minha memória como uma pessoa de coração grande.”
Fernando Jorge

“Numa altura em que não havia futebol oficial em Alpiarça, só havia ciclismo, existiam três equipas de futebol em Alpiarça, nenhuma oficial. Sr. António Lopes escolheu os melhores das três equipas para fazer a primeira equipa de futebol juvenil d”Os Águias”. O HermÍnio fazia parte dessa primeira equipa. (…) Sempre me dei muito bem com o Herminio, éramos grandes amigos. Só me chateava com ele por uma razão: ele tomava banhos muito longos! Toda a gente já tinha ido para casa e eu à espera dele. Algumas vezes tive de lhe desligar a água quente porque ele era sempre o último.”
José Joaquim Esteireiro

“Foi já no distante ano de 1974, mais propriamente no mês de setembro, que conheci o meu grande amigo Hermínio. Na altura, recém-chegado da Guiné, como gostava de jogar futebol, convidaram-me para fazer parte da equipa dos Águias. Foi uma época que me marcou muito, pois éramos uma família e os [jogadores] de fora eram tratados como se fossem da terra. O Hermínio foi a pessoa que mais me marcou, ficámos amigos inseparáveis, e a amizade passou também para a família. Fazíamos férias juntos, fins de semana, viagens… ainda hoje existem pessoas que pensam que somos família de sangue. Desde 2015, os Águias organizam, durante o mês do aniversário, um convívio dos ex-atletas do clube, e o Hermínio, como elemento da organização, sentia imensa satisfação em ver os colegas. (…) Por incrível que pareça, o destino assim o quis… a nossa história terminou da forma como começou, nos Águias! A última vez que estivemos juntos foi no último convívio dos Águias. Havia muitas mais coisas para contar deste grande Homem e grande amigo, mas a vida tem destas coisas, quando menos se espera recebemos notícias que nos chocam por vermos os Amigos que nos vão abandonando. Até um dia, Hermínio!”
Fernando Almeida

Hermínio Ferreira

Primeira Equipa de futebol Juvenil do Clube “Os Águias” de Alpiarça, ano de 1969
Primeira Equipa de futebol Juvenil do Clube “Os Águias” de Alpiarça, ano de 1969
Diretores e Seccionistas na inauguração da atual sede d”Os Águias”, em 7 de setembro de 1974
Diretores e Seccionistas na inauguração da atual sede d”Os Águias”, em 7 de setembro de 1974
Equipa de Iniciados d”Os Águias”, época de 1995/1996
Equipa de Iniciados d”Os Águias”, época de 1995/1996
Equipa de futebol feminino d”Os Águias”
Equipa de futebol feminino d”Os Águias”
Equipa de Juniores Campeões Distritais 2ª Divisão, na época de 1995/1996
Equipa de Juniores Campeões Distritais 2ª Divisão, na época de 1995/1996
Equipa Cooperativa Alfredo Lima – Reforma Agrária 1981
Equipa Cooperativa Alfredo Lima – Reforma Agrária 1981