Empresário mais antigo há 66 anos a arranjar bicicletas (c/vídeo)


Depois da morte, em 2013, de Zé da Loja, António Tacão passou a ser o empresário mais velho em atividade, em Almeirim. No dia 27 de maio, o “Tacão das Bicicletas” ou Rei da Paciência, como é conhecido, faz 85 anos e por esse
motivo recebeu o Jornal Almeirinense, na oficina.

Hoje em dia, as varizes atrapalham a mobilidade, mas a cabeça fresca dá ainda para recordar o percurso de uma vida cheia de trabalho e de histórias. Desde as 50 bicicletas que comprava de cada vez e voavam todas em dois meses, até às rifas que fazia, para as pessoas comprarem bicicletas a 20 escudos por semana.

Começou em 1950 e ainda continua a trabalhar?
Vou fazendo, o que antes demorava 10 minutos, agora leva mais de meia hora ou uma hora. Mas nesta fase o serviço também é muito menor.

Há menos serviços hoje? Porquê?
Há, e também menos vendas. Hoje em dia, o número de reparações em bicicletas é menor. Quando comecei, havia oito ou nove oficinas de bicicletas, mas a bicicleta era utilizada como uma máquina de trabalho. Os Prudêncios da Silva Santos, por exemplo, tinham terras e juntavam-se às 100 pessoas, cada um com a sua bicicleta, para ir para o campo. Havia a meia laranja, onde colocava os farnéis, e a bicicleta servia de meio de transporte para umas pervas que se apanhassem, ou cepas por exemplo. A bicicleta era uma máquina de trabalho, repito. Com tanto desgaste que tinha, todos os anos as bicicletas precisavam de uma corrente, uma roda pedaleira e um pinhão. Hoje há bicicletas que fazem quatro, cinco e seis anos sem levar uma corrente. A bicicleta agora é para passeio. Eu cheguei a ter clientes que vinham da Lamarosa e do Zebrinho…

Mas isto mudou muito?
Sim, mudou. Hoje já não se usa a bicicleta para trabalho. Há pessoas antigas que ainda têm bicicleta, mas são poucas as que a usam para ir buscar uma botija ou ir ao supermercado.

antonio-tacao

O Senhor António, como começou neste ramo?
Eu comecei com o Laudácias. Eles estavam no ramo automóvel e importavam bicicletas. Tinham muito consumo de bicicletas e nós montávamos e afinávamos as bicicletas. Tinham também latoaria e foi aí … Depois ainda fui para as Fazendas de Almeirim, num tempo em que a estrada era sem luz e de Macdame – do inglês McAdam: é um tipo de pavimento para estradas, desenvolvido pelo engenheiro escocês John Loudon McAdam, 1820. O processo recebeu o nome de Macadam em homenagem ao seu criador McAdam. As motorizadas surgiram em 1953/54 e o Dr. Albergaria tinha uma Lux e ia tudo a correr para ver o Dr. ir numa bicicleta a pedais com um motor ao meio. A partir daí começaram também as motorizadas. Aqui neste espaço estabeleci-me aos 19 anos. Comecei aqui a fazer uns biscates em casa. Aqui era um palheiro do meu pai que tinha um burro e palha … comprei ferramentas a um serralheiro das Fazendas, que foi para Lisboa, por 1200 escudos. No dia 17 de fevereiro de 1950 coletei-me nas finanças … foi sempre a andar para a frente com a chegada das motorizadas…

Mas já tinha conhecimentos de mecânica?
Não, não. No meu tempo as pessoas tinham uma parte artística e habilidade.

Chegou a ter quantos empregados?
Até hoje, tive 13.

E ao mesmo tempo?
Tive sempre só um. Estabelecidos, estão ainda três. Um na Azerveira, o Brioso das Honda e o Bento Roxo, que foi o meu primeiro empregado. E a vida chegou até aqui …

Mas o senhor tinha um vício?
Eu fui viciado na compra. Precisava de uma peça, mas comprava três. Mas isto chegou a uma altura que as três se esgotavam numa semana. Depois, com aquele vício de comprar, chegou a uma altura que preciso de uma, mas vem duas ou três. Só que as coisas começaram a morrer e começou a criar-se um stock sem venda. Eu tenho artigos com mais de 20 ou 30 anos. Ainda a semana passada vendi um artigo com 40 anos de existência. Dois aros de 28 e meio, que vendi para a Chamusca. Eu tenho um móvel com 360 gavetas e ainda há mais de cinco divisões por cada gaveta.

E sabe onde está tudo?
Não (sorrisos)… O cérebro não é eletrónico, mas vamos fixando. Eu tenho tudo com etiquetas, tipo código de barras, feito à moda antiga. Se eu tivesse juntado o dinheiro em vez de ter comprado tanto stock era melhor, mas eu era viciado em comprar.