Crónicas do Outeiro: Notícias de um Grande Muro Verde

Chegam-nos cada vez mais informações diárias sobre a desertificação em África e no mundo. Em África é notório esse fenómeno, correndo o continente o risco de desertificação de cerca de 40% do seu território. Poderemos pensar, “isso é lá com os Africanos, nós por cá até nem estamos mal”, mas a realidade pode ser outra.

Se o continente africano sofre na sua zona Este a pior seca das últimas décadas, as razões para tal são explicadas pelas alterações climáticas e pelo uso indevido ou excessivo dos solos, dentre outras. Por isso, a comunidade internacional, em conjunto com os países africanos afectados, tem em curso um plano de “florestação do deserto”, baptizado por Muro Verde. Com as medidas que estão a ser tomadas prevê-se contrariar no longo prazo os efeitos da seca e da desertificação. Mas, não pensemos que é só em África que existe este problema, porque em Portugal há também um risco muito sério de desertificação.

As causas para tal, estão igualmente nas alterações climáticas, a que se junta um sistema de culturas que deixaram o solo desprotegido, uma alteração na nossa economia que tem levado ao abandono dos campos e a falta de políticas agrícolas sectoriais geradoras de estabilidade e segurança para os agricultores. A juntar a tudo isto, Portugal surpreende os Europeus porque tem a maior área absoluta de eucaliptal plantada em toda a Europa, sendo, desde 2008, o maior produtor mundial da variedade de eucalipto globulus, à frente da Austrália e da Espanha. Na área total de eucaliptos plantados, Portugal fica somente atrás de colossos como a Índia, o Brasil, a China e a Austrália.

Não falamos em termos relativos, mas em termos absolutos de área plantada. Portugal, o pequeno jardim à beira-mar plantado, tem a maior área de eucalipto plantado de todo o continente. No total da área florestal nacional, 8,8% é dedicada a eucaliptos, o que nos coloca no topo da escala relativa dos produtores mundiais, de uma forma surpreendente.

O eucalipto tem uma rotação curta e um crescimento rápido, uma elevada produtividade e um retorno rápido nos investimentos, o que é óptimo para a economia de curto prazo, que não olha aos efeitos, no longo prazo, que pode provocar na floresta e nos terrenos agrícolas. Não é por acaso que se noticia que os eucaliptos “dominam os pedidos ao abrigo da nova lei de arborização”. É mau o que está a acontecer? Afinal as indústrias de celulose contribuem para o PIB e isso é bom. Deve, então, fazer-se um balanço do que é favorável e desfavorável. Para o objectivo do nosso artigo, vale a pena focar a forma como o eucalipto é aproveitado, porque é uma árvore que tem características que prejudicam os solos, porque é extremamente incendiável, esgota as águas e os nutrientes e torna-se incompatível com a biodiversidade local.

A área de floresta do nosso concelho é reduzida, mas não nos deve impedir de pensar sobre a melhor forma de a aproveitar. Aqui predominam os aproveitamentos de sobro e de eucalipto, sendo cerca de 860 hectares ocupados por sobreiro e 500 hectares por eucalipto. Os povoamentos mistos atingem 240 hectares.

A área de eucalipto tem vindo a aumentar em Alpiarça, acompanhando a tendência do País. Estes dados reforçam a preocupação com a necessidade de planear o futuro, de fomentar o ordenamento da floresta e de a prevenir contra incêndios, sendo que uma prioridade é a defesa da qualidade dos solos contra uma possível desertificação futura.

Devemo-nos preocupar com este valioso património, suscitando o debate público e sensibilizando os proprietários e a comunidade escolar, porque a base é a boa educação das pessoas.

Quando nos preocupamos com o património florestal de Alpiarça, apesar da sua relativamente pequena área, é porque é necessário que haja equilíbrio nas decisões futuras de ordenamento e de novos licenciamentos, para que o investimento não se perca com culturas prejudiciais para os solos, no longo prazo, e para que não venhamos também a pagar com o flagelo dos incêndios, pelos erros acumulados que são do conhecimento público.

Queremos progresso? Então plantemos árvores, mas saibamos definir as prioridades para o tipo de floresta que queremos projectar para o nosso concelho. Com bons exemplos de boas práticas, certamente encontraremos seguidores em toda a região.

João Monteiro Serrano
(o autor escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico)