A história das ideias republicanas na Vila de Alpiarça daria, por si só, uma outra. Assumindo as defesas da causa republicana em todo o Ribatejo, foi palco, nos últimos anos da Monarquia, de vários comícios contra a ditadura franquista.
O sair de uma crise, de uma cíclica miséria que, à época, imperava em Portugal era o objectivo que movia os portugueses e os alpiarcenses. Estes, afectados por uma crise vinícola, com um excesso de produção de vinho, em resultado do grande plantio após o combate da «Filoxera», doença que, no século XIX, arrasou as vinhas ribatejanas.
Devido à grande produção, o vinho tinha preços muito baixos e era pedido, por parte dos agricultores, que fosse comercializado a preços mais elevados, medida que a Monarquia não consegue resolver.
Em toda a região, o trabalho escasseava, os salários eram baixos, havia fome e pobreza e, tanto para os lavradores como para os trabalhadores, a República era sinónimo de melhores dias e a solução de todos os problemas populares.
O grito de desespero lançado à Monarquia, com a finalidade de comercializar o vinho a preços dignos não foi ouvido e, em 1907, o apelo de guerra pela República parte de Alpiarça e depressa chega a várias povoações rurais.
Quando João Franco pretende impor ao país a sua política económica e reaccionária, vários cidadãos de Alpiarça fazem-lhe frente, e assiste-se a uma grande resistência pelos campos da Estremadura.
Em 1907, aquando da jornada republicana pelo Ribatejo, é em Alpiarça, a 13 de Junho, que se dá uma das maiores recepções feitas aos republicanos: João Chagas, Alexandre Braga, António José de Almeida, Bernardino Machado e João Menezes. A recepção foi organizada por Joaquim Romão, médico e pessoa estimada por todos. O entusiasmo é enorme: homens, mulheres e crianças esperam os republicanos, dão-se vivas à República. Da varanda da casa de José Malhou, este e António José de Almeida falaram. Depois deste comício, em Alpiarça, a adesão ao partido republicano rondava quase os 100%, o que se provou nas eleições. No dia 9 de Fevereiro de 1908, o povo de Alpiarça aprova uma moção contra o governo de João Franco e recebe a visita de João Chagas. Na entrada da Quinta dos Patudos, surge uma manifestação a apoiar a sua causa. À passagem de José Relvas, João Chagas e Luíz Morotte, o povo reunido «exige» um comício de improviso.
Perante o discurso de Joaquim Romão, José Malhou, José Relvas, José Montez e João Chagas, o povo aclama e aplaude com entusiasmo. Em Alpiarça, o partido republicano, representado por João Chagas, obteve 580 votos, contra os 12 votos do partido monárquico, alcançando, assim, um dos melhores resultados no distrito, uma vez que, no total, obteve 5070 contra os 32 000 votos obtidos pelo partido monárquico.
Antes de 5 de Outubro de 1910, João Chagas volta a Alpiarça para participar numa conferência que se realizou no antigo teatro, existente na actual Rua Dr. Duarte Governo. O publicista, acompanhado por José Relvas, Ricardo Durão, Dr. Costa, Guedes de Amorim e José Malhou, discursou perante uma plateia entusiasta que muito o aplaudiu.
Depois de tanta luta, uma questão emerge: O que ganhou Alpiarça com o regime republicano? Muito. Foi um dos concelhos da República e viu a anexação da freguesia de Vale de Cavalos, durante este período; velha aspiração do povo de Alpiarça. José Relvas, como parlamentar, defende e assiste a esta anexação, tal como assistiu à sua desanexação e consequente integração no Concelho da Chamusca.
Alpiarça chegou mesmo a ser considerado o concelho rural mais republicano do país. É, decerto, uma Vila com história dentro da História em que o povo escreveu, escreve e continuará a escrever as suas mais belas páginas.
O Concelho de Alpiarça, concelho da república, foi criado pela Lei n.º 129, de 2 de Abril de 1914, cuja data se comemora com Feriado Municipal.
Da parte administrativa de Alpiarça pouco se sabe. Contudo, no século XIV, há documentação que situa Alpiarça no termo de Santarém. Relativamente à criação da freguesia, não encontrámos documentação, apesar de, em 1747, o padre Luiz Cardoso se referir a Alpiarça como freguesia.
Inquestionável é sim que, em 1826, Alpiarça era uma das freguesias do Concelho e Comarca de Santarém. Em 1835, foi desanexada por se situar na margem esquerda do Tejo, sendo incluída no Julgado e Comarca da Chamusca, onde permanece até 1875, ou seja, na província da Estremadura.
Em 1836, passa para o Concelho de Almeirim e, à época, era a sua maior freguesia, em conjunto com outras quatro: Almeirim, Muge, Monção de Benfica e Raposa.
Em 17 de Fevereiro de 1906, ainda freguesia de Almeirim, Alpiarça é elevada à categoria de Vila. Recorde-se o Diploma da Portaria Real a este propósito:
«Vistas as informações de Governador Civil do Distrito de Santarém acerca do que me representou a Junta da Paróquia da Freguesia de Alpiarça, do Concelho de Almeirim, e querendo dar a esta, por tal motivo e outras circunstâncias atendíveis, um testemunho de consideração: hei por bem fazer à mesma freguesia a mercê de a levar à categoria de vila de Alpiarça e me apraz que nesta qualidade, goze de todos as prerrogativas, liberdades e franquezas que directamente lhe pertencem; expedindo-se a competente carta em dois exemplares, um para título da referida junta e outro para ser depositado no Real Arquivo da Torre do Tombo».
Em 2 de Abril de 1914, pela Lei n.º 129, Alpiarça passa à categoria de Concelho, deixando assim de pertencer ao Concelho de Almeirim.
Cabe-nos, agora, a nós, como alpiarcenses, também dignificar a nossa terra e continuar a escrever a sua História.
Nuno Prates Conservador da Casa dos Patudos – Museu de Alpiarça
(autor escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico)